CRAQUES DA RESTAURAÇÃO: referência no setor, professor e pesquisador narra sua trajetória com projetos de restauração e destaca importância da produção científica para a busca de inovações na área.
Celebrando o mês do Dia dos Professores, escalamos o professor e pesquisador Ricardo Ribeiro Rodrigues para participar da série Craques da Restauração.
O entrevistado comenta sobre a relevância da parceria entre práticas de restauração e produção de conhecimento científico nas universidades.
“Como venho de Ciências Biológicas, no começo, fui bastante criticado, pois meus colegas acadêmicos não acreditavam que restauração era uma ciência. Felizmente hoje, vários deles praticam ou pelo menos defendem a restauração de ecossistemas como uma excelente solução baseada na natureza para amenizar as alterações climáticas.”
Ricardo é professor titular do Departamento de Ciências Biológicas da Escola Superior de Agricultura ‘Luiz de Queioz’, da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP), coordenou o Programa BIOTA da FAPESP e é coordenador do Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal (LERF/ESALQ).
No LERF, também coordena o Programa de Adequação Ambiental e Agrícola de Propriedades Rurais, com 4.250.000 ha de áreas em processo de adequação, com mais de 50.000 ha de matas ciliares e reservas legais restauradas e 125.000 ha de florestas remanescentes recuperadas.
Organizador do ‘Referencial dos Conceitos e ações de restauração florestal’ do Pacto, em 2009, Rodrigues tem feito enorme esforço na produção de publicações não acadêmicas (para orientar técnicos e produtores rurais), por exemplo:
- video “Como restaurar florestas”
- video “Metodologia para Restauração Florestal em situações SEM potencial de Regeneração Natural“
- série “João e a Restauração”
- Manual de Restauração da Vegetação Nativa (MT)
- Cartilha de Restauração (MT)
- Guia Técnico para a Recuperação da Vegetação em Imóveis Rurais no Estado da Bahia
Como você se aproximou da restauração de ecossistemas e quais suas principais experiências no setor?
Comecei a trabalhar com restauração de ecossistemas 33 anos atrás, quando entrei na ESALQ, por várias demandas que recebia na época de criar novas florestas, tanto de prefeituras como de proprietários rurais. Nessa época fui bastante influenciado, orientado e apoiado por três professores: Prof Carlos Joly, meu orientador de mestrado, professor Hermógenes de Freitas Leitão Filho, meu parceiro em tudo, e professor Paulo Kageyama, que já praticava restauração florestal na ESALQ, em parceria com CESP (Companhia Energética de São Paulo).
Como venho de Ciências Biológicas, no começo fui bastante criticado, pois meus colegas acadêmicos não acreditavam que restauração era uma ciência. Felizmente, hoje, vários deles praticam ou pelo menos defendem a restauração de ecossistemas como uma excelente solução baseada na natureza para amenizar as alterações climáticas.
Por estar na ESALQ, tive a estratégia de focar minha atuação em restauração de ecossistemas dentro da propriedade privada, onde criei o Programa de Adequação Ambiental e Agrícola de Propriedades Rurais. Esse programa resultou na adequação de mais de 4 milhões de hectares de propriedades rurais, com destaque às usinas de cana, empresas florestais e pecuária. Foi nesse programa que praticamos restauração de ecossistemas, restaurando mais de 50 mil hectares de florestas na condição de APP (áreas de preservação permanente) e RL (reservas legais) dentro de propriedades rurais em quase 30 anos.
Foi também nesse programa que formamos muitos profissionais em restauração de ecossistemas, mais de duas centenas, que atuaram como alunos ou recém formados no planejamento, implantação e monitoramento da restauração de ecossistemas nessas propriedades e hoje são profissionais, professores, administradores ou empresários da restauração de ecossistemas.
Além disso, foi onde geramos a maior parte do nosso conhecimento científico em restauração de ecossistemas, produzindo artigos científicos, livros e manuais com os resultados da avaliação e monitoramento continuado, e principalmente com a adoção de ações de manejo adaptativo nas áreas que estavam em processo de restauração de ecossistemas dentro do programa, com diferentes idades.
O que você espera da Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas (2021-2030) na Mata Atlântica e no combate à mudança climática?
Espero que essa iniciativa consiga desencadear a restauração em larga escala na na Mata Atlântica, que é um dos biomas mais degradados do Brasil e, por isso, onde a restauração de ecossistemas tem um dos custos mais elevados. Podemos e conseguiremos fazer isso, se pensarmos de uma forma inovadora, que traga benefícios para a natureza, mas também para as pessoas, através de Sistemas Agroflorestais biodiversos, da silvicultura de nativas, de provimento de serviços ecossistêmicos, de produtos não madeireiros e outras iniciativas de restauração multifuncional, incluindo o benefício econômico de quem decide implantar restauração nas suas propriedades.
Em que pé estamos, em termos de geração de conhecimento para garantia da efetividade das ações de restauração de ecossistemas da Mata Atlântica?
O conhecimento científico em restauração florestal evoluiu muito nas últimas décadas e certamente o Brasil é o principal gerador deste conteúdo. Mas ainda temos muitas lacunas que precisamos preencher com agilidade, principalmente para:
1- conseguirmos praticar restauração de ecossistemas e monitoramento da restauração em larga escala;
2- conseguirmos trazer benefícios da restauração também para as pessoas, além da natureza;
3- conseguirmos integrar restauração com a produção de alimentos, evitando assim que a restauração em larga escala seja responsabilizada pela redução de produção de alimentos, comprometendo a segurança alimentar, ou que a restauração de ecossistemas em larga escala incentive a abertura de novas fronteiras agrícolas;
Assim, precisamos pesquisar novas formas de produzir renda, praticando a restauração de ecossistemas.
A série Craques da Restauração é uma iniciativa do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica para valorização das personalidades ligadas ao histórico e às iniciativas de recuperação do bioma. Siga acompanhando pelos canais digitais do movimento!